A reconstrução da BR-319, que liga Manaus (AM) a Porto Velho (RO), e o avanço do desmatamento no entorno da rodovia estão diretamente relacionados à fumaça que encobriu a capital amazonense em outubro de 2023.
A conclusão é de uma pesquisa conjunta do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), da Universidade de São Paulo (USP) e da Universidade Federal do Amazonas (Ufam), divulgada nesta quarta-feira (24).
Outro levantamento do Inpa, publicado dias antes, projetou que a abertura de novas estradas a partir da BR-319 pode levar ao desmatamento de até 5,78 milhões de hectares até 2070, caso não haja mudanças na fiscalização ambiental e no modelo de ocupação da região.
Origem da fumaça
Os cientistas identificaram que a fumaça que encobriu Manaus em 2023 teve origem principalmente no entorno das rodovias BR-319 e AM-254, em municípios como Manaquiri, Careiro e Autazes.
No dia 12 de outubro daquele ano, a concentração de PM2.5 (partículas finas associadas à poluição atmosférica) chegou a 314,99 µg/m³, índice 20 vezes acima do limite recomendado pela Organização Mundial da Saúde (OMS).
De acordo com o estudo, os incêndios foram agravados pela seca extrema provocada pela combinação do fenômeno El Niño e do dipolo do Atlântico, que reduz a umidade na Amazônia.
O pesquisador do Inpa Philip Fearnside, coautor do estudo, descartou que a fumaça tenha vindo do Pará:
“Mensuramos tanto as emissões do estado quanto as do meio do caminho e elas não tinham a mesma proporção do nível de fumaça que chegou a Manaus.”
Impactos previstos da BR-319
Outra pesquisa, publicada na revista Regional Environmental Change, modelou dois cenários:
- Com a rodovia reconstruída: avanço acelerado do desmatamento com abertura de estradas planejadas e ramais ilegais.
- Sem a rodovia recuperada: desmatamento estável, sem aceleração significativa.
A BR-319, com 885 km, atravessa áreas de floresta preservada e pode impactar 63 terras indígenas, além de comunidades não reconhecidas oficialmente e populações isoladas, somando mais de 18 mil indígenas afetados.
Para a pesquisadora do Inpa Aurora Miho Yanai, principal autora de um dos artigos, a rodovia coloca em risco a meta nacional de desmatamento zero:
“Com a BR-319, tudo indica que o país terá dificuldade para cumprir a meta de desmatamento zero.”
O pesquisador Lucas Ferrante, da USP, reforça que a estrada pode ter consequências além do desmatamento:
“A BR-319 é uma fórmula para o desastre e servirá como espinha dorsal para aumento de incêndios e desmatamentos ilegais em área de floresta intacta, além de abrir áreas com reservatórios zoonóticos, com potencial de liberar novos patógenos preocupantes para a saúde global.”
*Com informações de O Globo
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